Américo

Pequeno, cabelo escuro, tez queimada pelo sol, Américo soma 36 anos de internamento em 56 de vida. “A minha mãe foi fazer queixa de mim e foram-me buscar. Dava-me mal com a minha família, batia-lhes. Dava-lhes pancada. Estava excitado”.
“Vai comprar! Vai comprar! Vai comprar!”, dispara a todos os que lhe pedem cigarros. Américo é um fumador compulsivo. Um homem impaciente. Com pressa de estar noutro lugar. “Davam-me tanta medicação, um gajo avaria logo, ficava logo avariado” despeja, um tanto agastado.

“Um dia abri a porta e a primeira coisa que vi foi uma pistola apontada. Entrou um grandalhão a gritar ‘Quero ser tratado! Quero ser tratado! Quero ser tratado!’ De repente parou. ‘Eu quero ser tratado antes que mate alguém. Por isso vim aqui. Faça o favor, aqui está a pistola, senhor enfermeiro. Antes que mate alguém fale com o médico para me tratar’”. Salvou-o um momento de lucidez. A pistola tinha uma bala na câmara, era só premir o gatilho – conta o Enfermeiro Carlos Magalhães, há 30 anos a lidar com a doença mental.
“Vi um outro doente atirar-se à cabeça de uma enfermeira com um ferro. Ela tinha um diabo a trepar-lhe pelas costas acima e o homem entendeu malhar no próprio demónio – a intenção era a melhor”.

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