Guardo-te...


Eu deixarei que morra em mim o desejo
de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa
de me veres eternamente exausto
No entanto a tua presença é qualquer coisa
como a luz e a vida.

E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto
e em minha voz a tua voz
Não te quero ter porque
em meu ser está tudo terminado.
Quero só que surjas em mim
como a fé nos desesperados.

Para que eu possa levar uma gota de orvalho,
nesta terra amaldiçoada,
Que ficou sobre a minha carne
como uma nódoa do passado.
Eu deixarei ...
tu irás e encostarás a tua face em outra face.

Teus dedos enlaçarão outros dedos
e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,
porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei a minha face
na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.

Porque meus dedos enlaçaram os dedos
da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência
do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos.

Mas eu te possuirei mais que ninguém
porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar,do vento,
do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente,
a tua voz serenizada.

Vinicius de Moraes

1 comentários:

Ana P. disse...

Adoro este poema. è dos mais lindos que conheço de Vinicius.
Beijos