Tu disseste para eu guardar o silêncio neste quarto. Para que nada dissesse, nem o teu nome. O teu corpo ondulava e eu aceitei a ausência. Disseste para eu nada pedir, para não nomear, não ter nenhuma palavra, nem exclamação, nem sorrisos, para não estar morta também. Para te responder com as mãos, silenciosas, os dedos a baterem-te como a chuva, tão de leve.

Estás suspenso, leve e suspenso e quente, portanto vivo, que surpresa! Só te envolves no berço, sem palavras, como antes delas, com o rosto amado a devolver-te um sinal de reconhecimento. Voltas a fechar os olhos, aninhas-te nos meus braços como se não me visses nunca, como se eu não existisse fora desse abraço por dentro. O meu cheiro como uma palavra acariciando a criança em ti, toda, e a curva da nuca abandonada. O peso tímido da tua cabeça a furar-me a pele, a quebrar-me o peito. Mordes a memória do leite, mexes os lábios, dói-me a secura. Não digo nada, o queixume é já desejo. Tem de ser plano e eterno este tempo, como se a morte pudesse roubá-lo se o dissesse. Não me pedes nada, e nem ousas a violência.

Ocultas tudo para que seja como antes do sono, um mergulho lento, desmembrado, com a aprovação de todos. Os lábios são doces, não procuram, conhecem a felicidade, provam com a língua, provam mais, redondos, enrolados, enormes como o quarto, com a cama que se afunda e nos leva, líquidos, desfeitos um no outro, numa celebração comum, silenciosa, não nomeada. Um abraço sem gestos, só um equilíbrio ténue, frágil.

Escorregamos sem esforço, não sei onde caímos, é a tua memória que nos guia, é o meu silêncio, todo o consentimento e o dom do teu acolhimento para que tudo aconteça longe daqui, sem eu nunca saber onde me levas e vou.

Lídia Martinez

1 comentários:

Anónimo disse...

Se eu não tivesse encontrado este sítio eu teria lamentado.


D.