volto já


A emissão sofrerá uma breve interrupção.
Retomarei logo que possivel...


"É tão bom começar a manhã com tudo o que queremos ser neste dia. Olhar sem medo pela janela, ensaiar uns passos fora da pele. Já não somos nós, nem mesmo é nosso o dia.Tropeçamos nos olhos espantados à voltado que vemos, precipitamo-nos para dentro e é tudo o pouco que fizemos. Dizemos que a pele é a nossa casa, enumeramos as assoalhadas, a arquitectura sólida, as vantagens de grades nas janelas. Depois fica-se triste até ao fim do dia. Há quem faça compras ou coma chocolate, quem diga mal de todos, quem não acorde a espreitar pela pele como ser outro, mas ele está a dois passos, a respiração, a temperatura, o olhar, o corpo móvel que se afasta levando o horizonte e só nos resta sonhar com a manhã seguinte e todos os dias - todos os dias - mentimos para dentro da pele."

PRINCÍPIOS DA MINHA NATUREZA (tomo I)



I

todos os meus gritos ao mundo são depositados num único pio de mocho.
e é o seu olhar penetrante que carrega a plena certeza de que esta minha noite - só esta - transporta a sina da eternidade.

II

dizem-me que a felicidade sussurrou por ai que me esperava mesmo debaixo de um lençol de chuva. num daqueles dias em que cada gota transporta um favo de mel. será seiva de vida para decorar a gula feliz dos meus lábios, em cada segundo da aventura erguida no calcorrear dos teus.

III

e que eu esteja envolto no turbilhão nascido da conversa das pétalas, enquanto abandonam o caule, sedentas da viagem alada, quando planam ao encontro de uma dança com a terra, onde a sua morte será o sacrifício para o nascimento do meu húmus.

estarei de volta, num erguer firme, sólido no odor da minha nova flor.



da minha janela vê-se uma espécie muito rara de angústia
tem o corpo que não ousei que me fosse
usa o amor como se fosse a origem da sede
e sossega-se contra o peito da alvorada

da minha janela vê-se uma espécie única de medo
chama-se eu mas diz-se tu
e por vezes nós quando prende a vida
a algo tão falível como a vida

da minha janela não se vê mais nada
ouve-se o silêncio contra mim
e chove morte contra os vidros
por dentro como soa o fim

Pedro Sena-Lino

SONHO


enquanto o tempo corre sofrego,penso em cada e todas as noites de luar que perdi sem que sequer a sombra de teu olhar repousasse perto de mim. e cedo ao desejo dos dias de ânsia que sonhei a paragem do meu tempo, erguendo cada palavra do meu verbo amar retirando a hipótese do fim ao caminho do meu sossego.



Sabes por vezes queria beijar-te. Sei que consentirias. Mas se nos tivéssemos dado um ao outro ter- nos- íamos separado porque os beijos apagam o desejo quando consentidos. Foi melhor sabermos quanto nos queríamos, sem ousarmos sequer tocar nossos corpos. Hoje tenho pena. Parto com essa ferida. Tenho pena de não ter percorrido teu corpo como percorro os mapas, com os dedos teria viajado em ti do pescoço às mão da boca ao sexo. Tenho pena de nunca ter murmurado teu nome no escuro. Acordado perto de ti. As noites teriam sido de ouro e as mãos teriam guardado o sabor de teu corpo.

al berto