quando o mar deixa
que as suas ondas afaguem teu corpo,
arranco seixos da áreia
e raivoso atiro-os sem pensar.
mergulho célere
rasgando as ondas,
torno minhas
conchas suas,
e só então
me deito a teu lado.
minha mão colada à tua
com conchas
para nos sossegar.
MARESIA
Caminho
Para as grandes aventuras,
Passam no ar palavras obscuras
E o meu desejo canta --- por isso marco
Nos meus sentidos a imagem desta hora.
Sonoro e profundo
Aquele mundo
Que eu sonhara e perdera
Espera
O peso dos meus gestos.
E dormem mil gestos nos meus dedos.
Desligadas dos círculos funestos
Das mentiras alheias,
Finalmente solitárias,
As minhas mãos estão cheias
De expectativa e de segredos
Como os negros arvoredos
Que baloiçam na noite murmurando.
Ao longe por mim oiço chamando
A voz das coisas que eu sei amar.
E de novo caminho para o mar.
Sophia de Mello Breyner Andresen
autópsia de Mia
elegia à sublime estética da imperfeição
Compõem-se de uma estéctica de tons sublimes.
Dentro, cá dentro, sou o seu compositor.
Que aplico a matemática da minha Verdade.
De dentro, cá para fora, sou um aplificador.
Espera
No ponto onde o silencio e a solidão
Se cruzam com a noite e com o frio,
Esperei como quem espera em vão,
tão nítido e preciso era o vazio.
Sophia de Mello Breyner Andresen
autópsia de Mia
NEVOEIRO
mais do que paleta de separação,
eis os dois pedaços de um espectro pictórico
que nos eleva ao todo!
na união, a plenitude.
na rejeição, o vazio.
o próximo segundo
da nossa vida:
esse perfeito desconhecido.
O amor chegou...
Aí estás tu à esquina
das palavras de sempre
amor inventado numa indústria de lábios
que mordem o tempo sempre cá.
E o coração acontece-nos
como uma dádiva de folhas nupciais
nos nossos ombros de outono.
Caiam agora pálpebras
que cerrem o sacrifício
que em nossos gestos há de sermos diários por fora .
Caiam agora que o amor chegou.
Ruy Belo
autópsia de Mia
Pudesse eu...
Vem, vamos fugir de maos dadas, amor.
autópsia de Mia